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sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Trabalho de Produção Oral e Escrita - 2º Periodo













Conto Viver outra vez

Grupo

Alex Gonçalves Rodrigues
5108426
Ana Paula Silva Alves
5026218
Ariana Aparecida
5108236
Dariel de Carvalho
5108555
Elisângela Veríssimo
5029152
José Rodrigues de Andrade Filho
5108607

Apresentação

Este trabalho é resultado de uma adaptação do conto dos anos 90, chamado “Viver outro vez”, de Márcio Barbosa. Foi gravado na Fazenda flafersflafers, município de Veríssimo, construída em 2 de Abril de 1929.


Conto
Viver outra vez

Com o solzinho da tarde, ela entrou no apartamento. Sábado.
- A entrevista, lembra?
Olhou as roupas espalhadas, móveis empoeirados e ele desculpou-se:
- Poucos vêm aqui. Achava que minha próxima visita seria a morte.
Observou-a. Pequena, inquieta, mãozinhas curiosas nos discos e livros.
Depois, pernas cruzadas - gravador ligado - murmurou, voz rouca:
- O terreiro do bairro quer fazer um trabalho sobre memória.
Ele, aborrecido negou depoimento. Tentava esquecer o passado - fantasma que se escondia sob a cama.
- O senhor ajudou a fundar associações, a desmascarar a ideologia da falsa democracia racial - ela insistiu.
Um dia fora professor. Mas ela não sabia que agora não era mais nada?
Que, há algum tempo, o coração vinha ameaçando parar?
- Minha filha, esqueça-se de mim.
Com o esforço de levantar-se arregalou os olhos. Ela assustou-se:
- Que foi?
- Tonturas, já passa.
Caiu, sem dizer mais nada.

Apavorada, ela procurou vizinhos, Um taxista veio. Gordo, dirigia com a barriga encostada ao volante. No pronto-socorro lotado, brigaram para serem atendidos. Um jovem médico os recebeu, perguntando:
- Seu pai? È só pressão um pouco alta, Vocês da raça negra são muito sujeitos a ter hipertensão.
Receitou maleato de enalapril e mandou-os embora.
Na volta, no taxi, ela ouviu-o, voz trêmula de velho,, sussurrar “obrigado”.
- Por fazer o senhor ficar nervoso – sorriu -, ir para o hospital?
- Por se preocupar comigo. Sabe, já estou no fim...
Ele olhou pela janela do carro. Viu crianças sem camisas jogando futebol nas ruas.
- Só não pensei – continuou – que fosse terminar viúvo, sem filhos, aqui, neste bairro, que é quase outra cidade. Quem povoou Perdizes, Bela vista? A negrada. Minha família sempre morou lá.
- Nasci aqui – ela afirmou. – É legal. Um pouco perigoso, ultimamente, Uns amigos morrendo por causa de drogas. Dezesseis dezessete anos. Não lhe parece que existe um plano para exterminar nosso povo?
O que o tocou, quando ela ergueu o rosto e fitou-o? Os olhos úmidos? Quase menina, tão preocupada com sua gente. Queria dizer-lhe para não se iludir, mas a frase ficou presa dentro do peito, mesmo quando ela voltou outras vezes, depois do trabalho, para ver como estava. Um dia chegou, irou o walk-man, passou os dedos nos móveis e exclamou:
- Tem tanto pó!
- Foi acumulando com as decepções – ele brincou.
No dia seguinte, de bermudas, coxas roliças à mostra, ela espanou, varreu. Não podia ver nada envelhecer? Pensava, com alegria de menina, em remoçá-lo? Num domingo, chegou com discos:
-Racionais, conhece? Bom pra caramba.
Ouviu e gostou. Parecia escutar a si mesmo nos versos dos raps, rapaz crescente revoltado nos cortiços do Bexiga, Mas o que a moça queria, enchendo o lugar com música, verificando se comida direito, arrumando as camisas no guarda-roupas?
- Vê-lo recuperar-se – ela dizia. – Já está mais moço.
Acreditava no poder de cura de mãos movidas por carinho, Deu-lhes as suas e levou-o a bares onde pagodeiros punham a alma para percutir os instrumentos. Dançou com ele, sob olhares curiosos, diferentes daqueles que os vizinhos lhes dirigiam, quando passavam nas ruas, mãos entrelaçadas. Ouvia-os dizer: Podia ser sua filha, que sem-vergonha.
Ela nem ligava. O velho mais desiludido tornava-se o mais animado. O homem que ajudara seu povo a se organizar despertava, às vezes, no trovão da gargalhada. Mas num sábado, tristezas de outrora emergiram no poço dos olhos. Ao vislumbrá-las, fez de tudo para levá-lo à praia. Pularam sete ondas, destacando as coisas ruins que pesavam nos ombros. Gota de água em seus cabelos era minúsculos sóis. Deitadinhos na areia, contou a ele sobre o pai, disse que jamais o conhecera. Os olhos marejaram, uma sombra passou por seu rosto. Então, mudou de assunto e puxou-o para brincar na água.
Voltaram da viagem à noite. Entraram no pequeno apartamento rindo de tudo, de nada. Dono ainda de olhos tristes, mais animados. Bateu-lhe no peito sem feri-lo. Acariciou sua carapinha... Depois, olhou-o durante um bom tempo e beijou sua boca sorridente, Idade pra ser o pai?
- Sou virgem – ela murmurou. – Não posso engravidar.
AS roupas ficaram no tapete, espalhadas.
De mãos dadas na padaria, no mercado, ouviam os vizinhos:
- É a sobrinha? – uns perguntavam.
Amante. – outros diziam, baixinho.
Ele ia receber a aposentadoria e ficava no ponto de ônibus meia hora. Enquanto outros reclamavam, permanecia impassível, dono de um segredo.
É a concubina, - Parecia escutar alguém sussurrando.
Sentia-se levar, até ser acometido por uma dorzinha besta no peito.
No centro da sala, o homem sentado no sofá é uma pálida lembrança daquele que, outrora, acreditara na sua gente. Que fantasmas o acompanhariam ao cemitério? Ela assustou-se, ao vê-lo com as mãos sobre o peito.
- Coração?
- Um coração enfraquecido pelas desilusões.
Por que não falava desses fantasmas?
- Não confia em mim?Quer dizer que não sou nada?
- O gravador – ele pediu, imediatamente após ouvi-la falar.
Esperou-a tirar o Sony da bolsa e continuou:
- No início do século, previa-se o desaparecimento da nossa, não digo raça, que só existe a raça humana. È melhor etnia. As elites brasileiras queriam um país sem negros e mulatos. Quando soube dessa idéia, a luz da revolta me iluminou, Uns amigos falaram-me sobre Zumbi, sobre quilombos, sobre união. Acreditei que a união fosse possível. Mas o sonho se desfez tão rápido! Os amigos se cansaram. O nosso povo? Desinteressado, apático, Não sei – enxugou lágrima – como não desapareceu.
- O que vocês fizeram foi bonito.
- São coisas que eu preciso esquecer.
- Hoje os problemas são mesmos. Mas há pessoas jovens querendo aprender, como eu. Quero acreditar em algo. Nosso povo sobreviveu porque acreditou na vida.
- É verdade. Parece que nós temos de adquirir uma força tão grande, parece que um amor pela vida se enraíza tão fundo dentro da gente, que nada nos abalada com facilidade, E se a gente cai, é pra levantar mais forte; se apanhamos, voltamos a brigar com mais garra; se choramos, também aprendemos a extrair, lá de dentro, uma gargalhada tão gostosa, que é como se toda a alegria do mundo coubesse me nosso peito. Somos negros e temos essa força. Isso é maravilhoso.
Ela abraçou-o, beijou-o. Só então ele se deu conta de que falta com entusiasmo. Uma parte do sonho ainda vivia, Mas as dores no peito persistiram. Ela vinha mais vezes, preparava arroz integral, moderou no sal e tirou o açúcar branco.
- A pinga com carqueja eu não jogo fora – ele protestou.
Era para diabetes um amigo tinha ensinado.
Ficara irritado com os excessos de cuidados, No fundo, sentia falta quando ela na vinha. A menina de uma geração tão diferente, com quem reaprendia a viver, A moça que acreditava nas coisas em que ele acreditara.
Num domingo, sentido o relógio no peito se acelerar, disse-lhe:
- Não vou ficar muito. Só lamento não ter tido filhos.
Notou que ela ficou calda, pensativa, Escondia algo?
Veio a na segunda-feira, Preocupada, tensa. Acusou-o de cerceá-la. Tensão pré-menstrual? Que havia?
- Estou grávida – disse, por fim. – Não posso. Tenho estudos.
Também não quero um filho pra crescer como eu, sem pai.
Foi até a janela. Suas lágrimas rolavam como a chuva lá fora.
- Um filho? – ele perguntou, incrédulo. – A soma do meu e do teu sonho. Olhe – pegou-lhe a mão pôs sobre seu próprio peito – parou de doer. Podemos criar esse filho, se você quiser. – Então abraçou-a e, com a voz embargada, soluçando,, falou: - Te amo.
Quando eles passavam, grávidos, ouviam os vizinhos comentarem:
É o filho – uns diziam.
O neto – outros apostavam.
- É o amor nos recriando – diziam um ao outro.


Adaptação do Conto
Viver outra vez - Márcio Barbosa



CENA 01 – INTERIOR CASA/TARDE.

A CÃMERA MOSTAR O Sr. ALBERTO ESCRENDO EM SEU LIVRO.

LOCUÇÃO: HÁ NA LITERATURA INÚMERAS HISTÓRIAS DE AMOR. ALGUMAS TRÁGICAS E OUTRAS FELIZES. EM ALGUMAS PERCEBEMOS UMA SIMETRIA EM CADA PERSONAGEM, HÁ OUTRAS UMA DISPARIDADE QUE FAZ CRESCER EM NÓS PRECONCEITOS E TRAUMAS. É FATO QUE O AMOR TUDO PERDOA. MAS É FATO TAMBÉM QUE O AMOR SÓ NÃO PODE CALAR A VOZ DAQUELES QUE ATIRAM PEDRAS. SABE POR QUÊ? PORQUE LHES FALTA O AMOR PRINCIPAL, QUE É O AMOR A SI MESMO.

A CÂMERA MOSTRA O RELÓGIO QUE MARCA 17H. DESCE PELA PAREDE, MOSTRANDO O MÓVEL E A NUCA DO SR. ALBERTO. FOCALIZA-O DE LADO E EM UM ÂNGULO GERAL O PEGO DE LONGE SENTADO NO SOFÁ NA SALA PRINCIPAL. A CAMERA VAI ATÉ ELISA DO LADO DE FORA QUE BATE Á PORTA ESPERANDO SER ATENDIDA.

Sr. ALBERTO: JÁ VAI, JÁ VAI.

Sr. ALBERTO SE LEVANTA E ATENDE A PORTA. FICA COM ELA MIO ABERTA ESPERANDO QUE ELISA SE MANIFESTE.

ELISA: BOM DIA Sr. ALBERTO. ESPERO QUE NÃO ESTEJA ENCOMODANDO O Sr. A ENTREVISTA LEMBRA?

Sr. ALBERTO: AH SIM! SIM.

ELISA: SOU DO JORNAL DIA A DIA E ESCREVO PARA O CADERNO PESSOAS E FATOS. GOSTARIA DE CONVERSAR COM O Sr.

Sr. ALBERTO: CLARO, CLARO, ENTRE.

A CÂMERA MOSTRA ELISA E O Sr. ALBERTO NO HALL DE ENTRADA. ELES SE CUMPRIMENTAM NOVAMENTE.

Sr. ALBERTO: EU VIVO MUITO SÓ. POR ISSO ACHEI QUE A PRÓXIMA VISITA SERIA A MORTE. FIQUE À VONTADE, ENTRE.

A CÂMERA MOSTRA ELISA PEGANDO UM LIVRO NO SOFÁ, ENQUANTO O Sr. ALBERTO PASSA MAL ENCOSTADO-SE À PORTA.

ELISA; UM GRAND EHOMEM. Sr. ALBERTO. FALTAM-NOS HOMENS ASSIM

FOCALIZA-SE ELISA QUE VAI ATÉ O Sr. ALBERTO NA PORTA.

ELISA: Sr. ALBERTO, O Sr. PRECISA DE ALGUMA COISA?

ALBERTO: NÃO FILHA, É ASSIM MESMO, COM O TEMPO, A MÁQUINA VAI EMPERRANDO AS ENGRENAGENS ATÉ PARAR.

ELISA: QUE ISSO Sr. ALBERTO, O Sr. É MUITO JOVEM AINDA. TEM MUITO A ENSINAR PARA ESSA GENTE.

ELISA AJUDA O Sr. ABERTO A SENTAR-SE NO SOFÉ. ENQUANTO ELE SE RECUPERA

Sr. ALBERTO: SENTE-SE FIQUE À VONTADE. QUAL É MESMO O SEU NOME:

ELISA: ELISA Sr. ALBERTO

Sr. ALBERTO: ELISA, ELISA EU VOU À COZINHA FAZER UM CHÁ. VOCÊ ACEITA UM CHÁ? A JUVENTUDE NÃO BEBE CHÁ, BEBE REFRIGERANTE.

ELISA: SÓ UMA ÁGUA. UMA ÁGUA POR FAVOR.

Sr. ALBERTO: SÓ UM MINUTO ELISA POR FAVOR.

CENA 02 – INTERIOR CASA/TARDE.

Sr. ALBERTO SE DIRIGE ATÉ A COZINHA. PEGA UM COPO DE ALUMÍNIO E TENTA ENCHÊ-LO DE ÁGUA, QUANDO se SENTE MAL E CAI. ELISA OUVE O BARULHO E SE DIRIGE ATÉ A COZINHA.

ELISA: SR ALBERTO? Sr. ALBERTO ESTÁ TUDO BEM? MEU DEUS DO CÉU. Sr. ALBERTO O Sr. ESTÁ PASSANDO MAL? OQ EU ACONTECEU? DEIXA EU TE AJUDAR. MEU DEUS LEVANTA. MAS UM POUCO PRA CÁ, SENTE-SE AQUI.

ELISA COLOCA O Sr. ALBERTO SENTADO EM UMA CADEIRA ENQUANTO ELE TOSSE VÁRIAS VEZES.

Sr. ALBERTO: OS REMÉDIOS.

ELISA: QUAL REMÉDIO Sr. ALBERTO

Sr. ALBERTO: TRAS TODOS. TRÁS TODOS

ELISA: CALMA, QUAL REMÉDIO?

Sr. ALBERTO: ESS, ESSE. NÃO SE PREOCUPE É PORQUE PASSOU DAS HORAS DE TOMAR.


APÓS O DIÁLOGO E A IDENTIFICAÇÃO DO REMÉDIO, ELA ENCHE UM COPO DE ÁGUA E LEVA ATÉ O Sr. ALBERTO.

Sr. ALBERTO: ESSE CORAÇÃO JÁ NÃO BATE COMO DEVIA.

ELISA: O Sr. ESTÁ SE SENTIDNO MELHOR?

Sr. ALBERTO: SIM, SIM, JÁ VAI PASSAR MUITO OBRIGADO.

ELISA: DEIXE QUE EU PREPARO O CHÁ.

ELISA VAI ATÉ O FOGÃO, TIRA A PANELA DE CIMA, VAI ATÉ O ARMÁRIO, RETIRA O BULE, ENCHE-O DE ÁGUA E O COLOCA NO FOGO.

Sr. ALBERTO: VOCÊ VEM FAZER SUA ENTREVISTA E EU LHE DANDO TRABALHO COM AS MINHAS SUJEIRAS.

ELISA: IMAGINA Sr. ALBERTO. E O Sr. ESTÁ AQUI TODO ESSE TEMPO SOZINHO?

Sr. ALBERTO: SOMOS TODOS SÓS. HÁ MUITOS ANOS PREVIA-SE A NORTE NÇAO DIGO DA RAÇA, PORQUE RAÇA SÓ EXISTE A RAÇA HUMANA, DIGO ETNIA. SEMPRE FOI ASSIM. A GENTE SÓ SERVIA PRO TRABALHO. AS NEGRAS ERAM USADAS PELOS CORONEIS, ERAM BOAS PARIDEIRAS, MAS SÓ NASCIAM FILHOS DA ESCRAVIDÃO. NÃO MUDOU MUITO DAQUELES TEMPOS PRA CÁ. HOJE OS NEGROS SÃO AINDA DISCRIMINADOS. ALGUNS CRIAM O SEU PRÓPRIO PRECONCEITO.QUEREM SER RECONHECIDOS. NO MEU TEMPO, UM NEGRO NASCIA POBRE, MORRIA POBRE E O MÁXIMNO QUE TINHA ERA O SONHO DE SER FORRO. HOJE OS NEGROS ESTUDAM, CASAM COM BRANCAS, ELEGEM-SE A CARGOS POLÍTICOS. EU VIVI MUTIOS ANOS QUERENDO ENSINAR QUE BRANCOS E NEGROS SÃO IGUAIS. QUANTO A LIBERDADE, ESSE TÃO SONHADO PAR DE ASAS, AINDA ESTÁ LOGEN DE CHEGAR.

ELISA: LIBERDADE, O QUE É LIBERDADE PARA O SR, Sr. ALBERTO?

Sr. ALBERTO: LIBERDADO É POSSUIR A SI MESMO. USEI DA MINHA LIBERDADE PARA ENCONTRAR UMA BOA ESPOSA, UMA BOA MULHER. CASEI-ME E MINHA ESPOSA MORREU 10 ANOS DEPOIS. NÃO TIVEMOS FILHOS. POSSUÍAMOS UM AO OUTRO. HOJE POSSUO SOMENTE O TEMPO QUE ME RESTA A ESPERA DA MORTE. ESSA SIM POSSUI A TODOS. NINGUÉM ESCAPA DAS SUAS GARRAS. VOCÊ POSSUI A VIDA TODA ELISA, PODE FAZER O QUE QUISER AINDA. RESTA-LHE TEMPO.

A CÂMERA FOCALIZA O SR ALBERTO QUE SE LEVANTA E VAI EM DIREÇÃO A ELISA.

ELISA: O Sr. ESTÁ MELHOR?

Sr. ALBERTO: ESTOU. ESTOU MUITO MELHOR. VOU PEGAR AS XÍCARAS PARA O NOSSO CHÁ.

AMBOS ESTÃO SENTADOS À MESA TOMANDO O CHÁ.

ELISA: O Sr. TEM UMA HISTÓRIA DE VIDA MUITO BONITA Sr. ALBERTO. UMA PENA QUE EU ESTOU COM O TEMPO MUITO CORRIDO, MAS EU GOSTARIA DE VOLTAR MAIS VEZES, PARA CONVERSARMOS MAIS, PARA AJUDAR O Sr. NAS TAREFAS DA CAS SE O Sr. PRECISAR E PRA TOMAR OUTRO CHÁ TAMBÉM.

Sr. ALBERTO: AH CLARO MINHA FILHA. VOLTE QUANTAS VEZES QUISER. A SUA COMPANHIA FOI DE GRANDE CONFORTO PARA MIM, ME AJUDOU BASTANTE. APENAS TE PEÇO UMA COISA, POR FAVOR, NÃO DESITA DE BATER NA PORTA, PORQUE O VELHO AQUI ESTPA FICANDO UM POUCO SURDO E NÃO ESCUTA MUITO BEM.

ELISA: IMAGINA Sr. ALBERTO.


CENA 03 – INTERIOR CASA/TARDE

ELISA E Sr. ALBERTO SAEM DA COZINHA E DIRIGEM-SE ATÉ A SALA PRINCIPAL. APÓS SE DESPEDI DELA ELE VOLTA PARA O SOFÁ, SENTA-SE E TIRA O CHAPÉU.

ELISA: Sr. ALBERTO MUITO OBRIGADA, NÓS CONTINUAMOS AMANHÃ.

Sr. ALBERTO: POR NADA

ELISA: ÀS 9 HORAS ESTÁ BEM PRO Sr?

Sr. ALBERTO: CLARO, CLARO. PERFEITAMENTE.

ELISA: ESTAMOS COMBINADOS.

O Sr. ALBERTO ACOMPANHA ELISA ATÉ A PORTA

ELISA: ENTÃO ATÉ AMANHÃ

Sr. ALBERTO: ATÉ AMANHÃ


CENA 04 – INTERIOR CASA/MANHÃ

ELISA VARRE A CASA, LIMPA OS MÓVEIS, OLHA NA ESTANTE OS DISCOS DE VINIL, ENQUANTO O SR ALBERTO A OBSERVA SENTADO NO SOFÁ.

ELISA: COMO TEM POEIRA POR AQUI.

Sr. ALBERTO: FOI ACUMULANDO COM AS DECEPÇÕES DA VIDA ELISA

ELISA: PELO JEITO O SR GOSTA DE MÚSICA Sr. ALBERTO

Sr. ALBERTO: GOSTO, GOSTO BASTANTE.

ELISA: DE SAMBA INCLUSIVE.

Sr. ALBERTO: AH, JÁ FUI MUITO BOM DE BAILE BAILAVA NO SALÃO COMO UM VETERANO.

ELISA: TEM UM SAMBA LEGAL QUE EU QUERO MOSTRAR PARA O Sr.

Sr. ALBERTO: AH SIM

ELISA: O SR TEM TOCA CDS?

Sr. ALBERTO: TENHO, TENHO SIM, DENTRO DO ARMÁRIO. EU GANHEI ELE EM UM BINGO QUE TEVE ALI NA IGREJA, MAS NÃO ESCUTO CD, EU PREFIRO O VINIL SABE.

ELISA: SE O Sr. GOSTAR DA MINHA MÚSICA POSSO LHE DEIXAR VÁRIOS CDS PARA O Sr.

Sr. ALBERTO: QUE BOM

ELISA: VOU PRECISAR DE UMA TOMADA.

Sr. ALBERTO: ALI, ATRÁS ELISA, ATRÁS DA TV. E VC? DANÇA ELISA?

ELISA: EU GOSTO MUITO DE DANÇAR, MAS TENHO TRABALHADO TANTO Sr. ALBERTO, CONFESSO QUE NEM ME LEMBRO DA VEZ QUE DANCEI.

ELISA ESCOLHE EM SUA BOLSA OS CDS QUE TROUXE.

Sr. ALBERTO: AH JUVENTUDE. SE VOCÊ SOUBESSE O QUANTO É BOM DANÇAR. VOCÊS DANÇAM MUITO DIFERENTES, NA MINHA ÉPOCA, NÓS DANÇÁVAMOS DE DOIS EM DOIS. QUE SAUDADE.

ELISA: O Sr. VAI GOSTAR DESSA MÚSICA.

Sr. ALBERTO: E QUEM CANTA?

ELISA: SEU JORGE.

Sr. ALBERTO: SEU JORGE? QUE NOME ENGRAÇADO.

ELISA: UM BOM SAMBISTA.

Sr. ALBERTO: NA MINHA ÉPOCA EU GOSTAVA MUITO DE AGEPÊ. JÁ ESCUTOU.

ELISA: JÁ OUVI DIZER, MAS NÃO CONHEÇO.

Sr. ALBERTO: UM DIA EU COLOC PRA VOCÊ.

ELISA: COMBINADO.
ELISA CONVERSA COM O Sr. ALBERTO, E ABRE AS JANELAS.

ELISA: VIU COMO O CLIMA ESTÁ MELHOR? ESSA CASA TAVA PRECISANDO DE UM POUCO DE LUZ E MÚSICA. DEPOIS QUE EU TERMINAR, VAMOS DAR UMA CAMINHADA NO QUARTEIRÃO PARA O Sr. RESPIRAR UM AR DIFERENTE.



CENA 05 – INTERIOR CASA/MANHÃ

ELISA LIMPA A ESTANTE, LAVA A LOUÇA. Sr. ALBERTO NA SALA LEVANTA LENTAMENTE E OS DOIS SAEM DA CASA. ELISA AMPARA O Sr. ALBERTO, ATÉ UM BANCO DE ALVENARIA EMBAIXO DA ÁRVORE.

ELISA: CAMINHA É MUITO BOM. FAZ BEM PARA A SAÚDE E PARA A CABEÇA.

Sr. ALBERTO: EU NÃO ERA TÃO SEDENTÁRIO ASSIM.

ELISA: NÓS VAMOS APROVEITAR O CLIOMA PARA LER UM POUCO, O QUE O Sr. ACHA?

Sr. ALBERTO: O QUE NÓS VAMOS LER HOJE?

ELISA: UM POUCO DE NELSON MANDELA

Sr. ALBERTO: QUE GRANDE HOMEME, AQUELE TEMPO DELE NA PRISÃO PARA SALVAR TODA AQULEA GENTE.


CENA 06 – INTERIOR CASA/TARDE

A CÂMERA MOSTRA Sr. ALBERTO E ELISA CONSERSANDO NA SALA. ELE LHE CONTA A SUA HISTÓRIA.

Sr. ALBERTO: TEMOS QUE TER AMOR PELA VIDA, FAZER COM QUE ELA SE ENRAIZE EM NÓS. CLARO QUE HÁ MUITO SOFRIMENTO. SE A GENTE CAI É PRA LEVANTAR MAIS FORTE, SE APANHAMOS, APRENDEMOS A EXTRAIR UMA GARGALHADA COMO SE NÃO COUBESSE NO PEITO. SOMOS NEGROS, E TEMOS ORGULHO DESSA FORÇA, TEMOS HISTÓRIA. TEMOS SANGUE NAS VEIAS.

ELISA: Sr. ALBERTO, O Sr. ESTÁ BEM?

Sr. ALBERTO: FOI SÓ EMOÇÃO. ESPERE, TENHO QUE LHE MOSTRAR ALGO.

Sr. ALBERTO AÍ ATÉ O QUARTO E TRAZ NAS MÃOS UM BAÚ. SENTA-SE AO LADO DE ELISA E MOSTRA-LHES AS FOTOGRAFIAS.

Sr. ALBERTO: OLHA ELISA QUANDO EU TINHA 18 ANOS.

ELISA: QUANTO TEMPO.

Sr. ALBERTO: ESSA FOI NO MEU BATIZADO. O MEU PADRINHO AUGUSTO. SANTO HOMEM. ESSA AQUI É MINHA FALECIDA ESPOSA. OLHA ERA LINDA. ESSA É MARAVILHOSA, EU DIA EU LHE CONTO ESSA HISTÓRIA. ESSA AQUI É OUTRA, É MAIS RECENTE. FOI LOGO ALI NA FESTA. VOCÊ GOSTA DE FLORES? OLHE.

NESSE MOMENTO A CÂMERA FOCA O OLHAR DIRETO NOS OLHOS DO Sr. ALBERTO À ELISA. INSTALA-SE ENTRE OS DOIS UM SILÊNCIO.

ELISA: Sr. ALBERTO, EU PRECISO IR. EU VOLTO AMANHÃ

Sr. ALBERTO: ESTÁ BEM. ESTÁ BEM, MAS VOLTE MESMO.

ELISA: COMBINADO

ELISA SAI DA SALA E O Sr. ALBERTO FICA ABRAÇADO AO BAÚ.

CENA 07 – EXTERIOR CASA/TARDE

O SR ALBERTO ESTÁ NA JANELA OLHANDO VÁRIAS VEZES PARA O RELÓGIO AGUARDANDO A CHEGADA DE ELISA. EM SEGUIDA FECHA A JANELA. ELISA VEM COM VÁRIAS SACOLAS NA MÃO CANTAROLANDO UMA CANÇÃO. DEIXA AS COMPRAS NO CHÃO, DESTRANCA A PORTA E ENTRA.

ELISA: Sr. ALBERTO? Sr. ALBERTO CHEGUEI. TROUXE UMAS COMPRINHAS, UMAS FRUTAS PARA O Sr.

Sr. ALBERTO: SIM, SIM. VOCÊ ESTÁ BEM?

ELISA: SIM E O Sr., COMO PASSOU DE ONTEM?

Sr. ALBERTO: MUITO BEM. EU VI QUE A DOROTY ESTAVA CONVERSANDO COM VOCÊ, O QUE ELA QUERIA?

ELISA: AH! A DOROTY RECOMENDOU LEMBRANÇAS.

Sr. ALBERTO: LEMBRANÇAS?

ELISA: SIM

Sr. ALBERTO: ELA NUNCA VEIO AQUI. NUNCA SE INTERESSOU EM SABER NENHUM DIA COMO EU ESTAVA. AH, ENFIM. TENHO UMA SUPRESA PRA VOCÊ.

ELISA: QUE MARAVILHA. O QUE É?

Sr. ALBERTO: SÓ UM MINUTO

O SR ALBERTO BUSCA UM CADERNO DE CAPA VERMELHA E ENTREGA A ELISA.

ELISA: O QUE É ISSO?

Sr. ALBERTO: SÃO AS MINHAS MEMÓRIAS. TODA A MINHA VIDA ESTÁ ESCRITA AQUI ELISA. ESTOU PERCEBENDO QUE PARA MIM NÃO RESTA MUITO TEMPO

ELISA: QUE BOBAGEM

Sr. ABERTO: POR FAVOR, ESCUTE. VOCÊ PODE USAR COMO QUISER, DA FORMA QUE QUISER, MAS SÓ ME PROMETA UMA COISA. VOCÊ SÓ VAI LER A ÚLTIMA PÁGINA QUANDO EU ME FOR.

ELISA: EU NÃO QUERO QUIE O Sr. FIQUE FALANDO ESSAS COISAS.

Sr. ALBERTO: ELISA, VOCÊ TEM MUITO TEMPO AINDA PELA FRENTE. VOCÊ PODE FAZER O QUE QUISER, APROVEITE. FOI MUITO BOM ESTE TEMPO EU VOCÊ ESTEVE AQUI EM CASA. TODAS AS SUAS PERGUNTAS, TODOS OS DIAS EU ME SENTI UM JOVEM. EU RETORNEI HÁ 30 ANOS ATRÁS ELISA, COM A SUA PRESENÇA. VOCÊ ME LEMBROU O CARINHO DE UYMA PESSOA MUITO ESPECIAL QUE SE FOI.

ELISA: EU VOU GUARDAR COM MUITO CARINHO. MAS NÓS TEMOS MUITA COISA PRA VIVER AINDA. EU TENHO MUITOS PLANOS. EU APRENDI MUITO, MAS AINDA TENHO MUITO PRA APRENDER COM O Sr.

Sr. ABERTO: MAS EU NÃO TENHO MUITO PRA TE ENSINAR. A SUA MATÉRIA VAI SER PUBLICADA.

ELISA: A MINHA MATÉRIA JÁ ESTÁ PRONTA Sr. ALBERTO.

Sr. ALBERTO: COMO ESTÁ PRONTA? PORQUE VOCÊ NÃO ME MOSTROU?

ELISA: PORQUE A PRINCÍPIO Sr. ALBERTO, MINHA MATÉRIA ERA O MOTIVO PARA EU ESTAR AQUI. EU TEMIA NÃO TER MAIS MOTIVO PARA FICAR NA SUA COMPANHIA. NÃO TER MAIS MOTIVO PARA CUIDAR DE VOCÊ. O QUE ESTÁ ACONTECENDO AGORA VAI MUITO ALÉM DO MEU TRABALHO.

Sr. ALBERTO: MINHA JOVEM.

Sr. ALBERTO E ELISA FICAM ABRAÇADOS NA COZINHA.
CENA 08 – INTERIOR/ESCRITÓRIO JORNAL/MANHÃ

ELISA ESTÁ NO ESCRITÓRIO DO JORNAL LENDO OS NOTICIÁRIOS.

ELISA: CADERNO PESSOAS E FATOS ELISA BOM DIA. COMO ASSIM? AI MEU DEUS. QUANDO FOI ISSO? EU JÁ ESTOU INDO.

ELISA VIA ATÉ A CASA DO Sr. ALBERTO, NO GUARDA ROUPAS ESCOLHE UM TERNO, ABRAÇADA A ELE CHORA ENCOSTADA NA PORTA.


CENA 09 – INTERIOR/IGREJA TARDE.

ELISA ABRE O CADERNO DEIXADO PELO SR ALBERTO E LÊ O SEU TEXTO. SAI EM DIREÇÃO A RUA, DESDE AS ESCADAS SE SEGUE O SEU CAMINHO, QUANDO A CÂMERA AOS POUCOS SOBE ATÉ O AZUL DO CÉU.



Agradecimentos

Agradecemos a Helena Borges que nos fez refletir sobre a enorme responsabilidade, em passar para imagens as palavras, dando a pessoas que não sabem ler, a possibilidade de verem o quanto somos ricos nas coisas mais simples.
A Valéria, que cedeu-nos o espaço da fazenda e o seu escritório na Loja Galeria dos Presentes, para a gravação desse curta.
Ao Bruno que embora não faça parte desse curso, ajudou-nos a montar os espaços para as filmagens, bem como os caseiros que gentilmente nos cederam sua cozinha.
A Marlene e as crianças que mesmo não aparecendo no vídeo puderam colaborar com o nosso trabalho.
Não poderíamos deixar de lado o nosso amigo Diógenes, que não só acreditou na idéia, mas vestiu a camisa, o colete, colocou a mochila nas costas e pegou estrada com a gente.









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